Mantiqueira e a cabeceira do rio São Francisco, e notaram que os leitos e os bancos de
vários rios e riachos que por ali corriam continham traços de ouro aluvional em pequenas
quantidades visíveis. A ação milenar das chuvas tinha roído os filões de ouro das rochas e
os havia depositado nos rios, no fundo dos vales e nas depressões das montanhas. Sob as
camadas de areia, terra ou argila, o pedregoso subsolo oferecia pepitas de ouro, fácil de
extrair do cascalho de quartzo; os métodos de extração tornaram-se mais complicados na
medida em que se foram esgotando os depósitos mais superficiais. A região de Minas
Gerais entrou assim, impetuosamente, na história: a maior quantidade de ouro então
descoberta no mundo foi extraída no menor espaço de tempo.
“Aqui o ouro era mato”, diz, agora, o mendigo, e seu olhar passeia pelas torres das
igrejas. “Tinha ouro nas calçadas, crescia como pasto.” Agora ele tem 75 anos e se considera
uma tradição de Mariana (Ribeirão do Carmo), a pequena cidade mineira próxima a
Ouro Preto, que se conserva, como Ouro Preto, paralisada no tempo. “A morte é certa, a
hora incerta. Cada um tem seu tempo marcado”, me diz o mendigo. Cospe sobre a escada
de pedra e sacode a cabeça: “Não sabiam onde pôr o dinheiro e por isso faziam uma igreja
ao lado da outra.”
Em outros tempos, esta comarca era a mais importante do Brasil. Agora... “Agora
não - me diz o velho.- Agora isto não tem vida nenhuma. Aqui não tem jovens. Os jovens
se vão.” Caminha descalço, a meu lado, em passos lentos sob o tíbio sol da tarde: “Vê? aí,
na frente da igreja, estão o sol e a lua. Isso significa que os escravos trabalhavam dia e noite.
Este templo foi feito pelos negros; aquele, pelos brancos. E aquela é a casa do monsenhor
Alípio, que morreu aos 99 anos justos.”
Galeano, Eduardo
As Veias Abertas da América Latina: tradução de Galeano de Freitas, Rio de Janeiro, Paz e Terra,(estudos latino-americano, v.12)Do original em espanhol: Las venas abiertas da America Latina
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